
Pela madrugada gosto de ir à varanda do meu apartamento.Lá, fico por algum tempo sozinha, no silêncio e na escuridão.Fico calada, olhando e imaginando.
Quando faço isso sinto-me diferente.É como um refúgio, um instante de fuga da realidade. Quando eu deixo de ser eu, viro apenas alguém escondida, abrigada e ofuscada pela multidão. Um grão de areia em meio a milhões de grãos.
Uma multidão silenciosa. Abrigada em suas casas, seus lares. Cada um do seu modo. Cada um no seu refúgio. E olhando aquele monte de casas e prédios fico a imaginar como é cada morador, cada família. Seus problemas, seus comportamentos.
Tanta imaginação, tanta observação, acabo conhecendo os comportamentos dos insônes. Como o vizinho da esquina, que assim como eu, passa o tempo olhandopela varanda. A única luz acesa da rua.Ele é uma figura distorcida atrás da grade, assim como eu.
Mas ao olhar o resto da cidade percebo que não somos os únicos. Há sempre pontos luminosos brancos isolados pela escuridão, pela luz amarelada dos postes e pelo silêncio.
O encantador silêncio que faz a cidade parecer parada.Transmite uma paz. O som do silêncio demonstra que até a ferocidade urbana tem seu descanso.
Mas no fundo da paisagem,convocando silenciosamente à realidade, há uma chaminé de uma fábrica ao longe. Expelindo fumaça todo o tempo. Ela não para nunca, madrugada a dentro produzindo. E me relembra, que assim como a fábrica a vida não pode parar.